sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

O Artesão de palavras

O Artesão de palavras - Márcio Barker
imagem retirada de http://migre.me/srooh
Sabe? Sempre trabalhei com palavras, frases, textos, histórias.
À minha maneira, as palavras tem alegria, dúvida, incerteza, tristeza...
Têm também cores, tons, semitons, podem ser claras, cinzentas, escuras.
Ao meu modo, modestamente, dei a elas sabores, ora doces, azedas, apimentadas e, às vezes, até salgadas. Acreditam?
Ah, sim. Soube, também modestamente, fazê-las soar!.
É sim. Palavras com sons! Agudos, médios, graves, do vento, do trânsito, do mar, da discussão, do sussurro, do gemido de prazer, do grito aflito e por aí vai.
Hummmm...também com sentimentos. Carregadas das cores trágicas do ódio, quem sabe do vermelho do amor, do amarelo da alegria, do azul da paz.
Palavras com alma. Sim. Da impaciência, da rebeldia, da contestação, da fúria.
Ah, sim. Palavras, palavras e palavras. Elas são hábeis. Tornam-se quase tudo.
Explicar, dizer, falar, mostrar, exemplificar. Sim. Palavras versáteis, mágicas, falam de tudo, de todos, de qualquer coisa...
É.... mas será mesmo? Depois de uma vida inteira forjando modestamente palavras, estou em grave dúvida.
Sabe por quê?
Porque não sei onde procurar no meu arsenal de palavras, uma única, que descreva o seu rosto!
A vida é uma eterna surpresa!!!!

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Arrependimento?

Arrependimento - Márcio Barker
imagem retirada de http://migre.me/spxNJ

Sabem?
Não me arrependo de ter mandado muita gente à merda
É...mas me arrependo muito mais, de não ter mandado outros tantos.
Não me arrependo de ter saído fora da linha.
Mas me arrependo de não ter saído muito mais.
Não me arrependo de nunca ter me empenhado em aprender gramática portuguesa.
E me arrependo do tempo perdido  tentando decorar declinações do latim.
Não me arrependo de algumas malcriações minhas, mesmo que tenham custando palmadas e castigo.
Deveria ter sido mais ainda, com aqueles que mereceram minha malcriação
AH, e tem mais. Me arrependo tanto com muitas de minhas noites perdidas com preocupações
Me arrependo muito de ter  sofrido pelo meu saldo bancário.
Hoje quero  que tudo se lixe. (mas não fiquei rico, não)
Me arrependo, ainda,  de ter que pedir desculpas a quem não merecia...coisa que nunca mais fiz.
Não sou mentiroso, mas não me arrependo de algumas mentiras que contei.
E me arrependo de certas verdades que falei.
Não me arrependo da minha cara de anjo, que no fundo escondia o ´´demônio´´.
 Um  ´´demônio´´ que me  arrependo não ter sido mais vezes.
Não me arrependo das infinitas ´´colas´´, nos dias de prova, de matérias inúteis
Me arrependo das notas vermelhas, por não ter ´´colado´´.
E das azuis inúteis que tirei.
Não me arrependo em absoluto por não votar  mais  em rigorosamente ninguém
E, puxa!!! Como me arrependo de ter confiado, e votado em quem nunca mereceu.
Não me arrependo de, vez por outra, ter explodido em palavrões.
E, que pena, não ter explodido muito mais.
Não me arrependo de ter sido sempre sincero.
Me arrependo sim, quando minha sinceridade feriu alguém.
Não me arrependo de ter sido um bom camarada. Mas às vezes, bem que eu poderia não ter sido  tão bom assim.
Me arrependo de muitas escolhas.
Mas não de algumas delas.
Ah, sim.  E não me arrependo por  ter nascido.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Bem Vira-Latas


                                                    Bem Vira - Latas 
                                                                                                             Márcio Barker

evete-veterinária


Mal criado quando criança.
Detestava sopa. (preferia doces).
Fugia de velhos (e velhas) chatos (as).
Respondão.
Não entendia gentilezas inúteis.
Ficava com raiva quando outros faziam promessas...que ele tinha que pagar.
Rebelde.
Cresceu.
Vagabundo na escola.
Odiava gramática portuguesa, latim e francês.
Pudera quem aguentava?
Amava desenho, música e história.
Detestava horário. (ainda detesta)
E, levantar cedo via como uma ofensa grave. (continua com a mesma opinião)
Odiava beijar mãos de padrinhos, madrinhas e o raio que parta (vão se catar!)
Rebelde.
Cresceu mais um pouco.
Sempre que podia, comia as namoradas (na época, todas virgens) (Era a moral vigente)
E as que não comeu, enfiou as mãos (e os dedos), até os últimos recônditos e reentrâncias possíveis (e imagináveis)
Rebelde, acreditava que as regras foram feitas para serem quebradas.
´´Voltem antes do anoitecer, às seis! Se não voltarem, não saem mais, ouviram???´´.
He, he. Mas claro. Então trepava-se até às cinco e meia. Simples.
Foi descartado algumas vezes como ´´mau partido´´, pelos pais de algumas dozelas com que se metia.
Navegar contra a corrente e caminhar com o vento contra, era um exercício artístico.
Fazia questão de não entender nada de tato, ´´média´´, ou diplomacia.
Por vezes foi feliz, quando descartou o ´´bom senso´´.
Inconveniente, fazia do constrangimento, uma arte.
Odiava o sorriso forçado, e a aparente perfeição.
O maior desejo era ser um vagabundo.
Sim, mas um vagabundo daqueles. Descompromissado, como todos os vagabundos.
Mas um vagabundo com charme.
Um vagabundo amante da vida.
Sem relógio (apesar de horários)
Sem ideologia (nem sempre)
Sem consumismo (apesar das tentações)
Sem dar a mínima bola para o estabelecido, ou pré-estabelecido.
Foi mesmo tudo isso?
De certa forma...
...ao menos tentou ser...lutou para ser...
... de certo modo continua sendo.
Pois é. Longa vida aos rebeldes, aos inconformados, aos que nadam contra a corrente.
Longa vida aos que correm na contramão do lugar comum.
Longa vida aos sabem que as regras foram feitas para serem quebradas...
...e as quebram.
Longa vida aos que desafiam, que desacatam, que são desaforados com a mesmice.
Longa vida aos loucos que odeiam a rotina, em nome daquilo que acreditam no íntimo...
...e não têm medo de ser, o que realmente são.
E daí? Entre ganhos e danos empatou?
Não! Pouco importam os danos!
O que valem são os  ganhos.
Então, saí no lucro!!!
Não é????

Viva a rebeldia e o rock´n roll!!!! rssssssssssssssssss

terça-feira, 4 de agosto de 2015

O Bóris




                                       O Bóris
                                                           Márcio Barker



Num dia chuvoso, vi esse camarada da foto se protegendo debaixo de uma laje. Dias depois cruzei com ele, em minha rua. Nunca o tinha visto. Seria de algum vizinho? Fiquei preocupado, quando voltei a vê-lo perambulando por ali e aqui.
Daí reparei: 
Maltratado, pelo surrado, desengonçado, manco, desbotado.
Sem destino?
Sim!
Então, por favor, entre. A casa é sua.
Aceitou o convite de bom grado...acho até, que de ótimo grado!
Era cardíaco, sobrevivente de um tremendo atropelamento, e com infecção urinária.
Tinha cara de bom sujeito. Meio calado e sossegado. Depois descobri que era por causa fome.
Veterinário, remédios, boa comida, água fresca, casinha, amizade e um belo osso.
Quer mais?
Já era idoso. Muitas foram as vezes que perguntei de onde veio. Discreto, nuca me respondeu. Entendi, vida sofrida. Além disso, as incontáveis cicatrizes no focinho, e na cabeça, falavam de muitas histórias.
Recuperado, mostrou-se um latidor de alto porte. Sua voz possante muitas vezes sofreu advertências minhas. Intolerante com os seus iguais, logo virava a mesa. Meteu-se em uma série de confusões, nas quais tive a oportunidade de participar como a ´´turma-do-deixa-disso´´.
AH, sim. Romântico, era dado a uivos. Não poucas vezes tive que, com tato, solicitar que se contivesse, pois estávamos em meio à alta madrugada. Mas eu entendia...ele nem tanto...
Olhos agradecidos, era um gentleman, pois comia educadamente, sem afobação. Mas com ódio, expresso pelos dentes arreganhados, fazia de tudo para que eu não desse suas medicações diárias.
Fortão e troncudo, caminhava pesadamente, com calma. E, íncrível, era o rabo girando como hélice.
Sim. Era um vira-lata. Mas um vira-latas da gema.
Da mais nobre casta da viralatísse, sim senhor, e graças a Deus.
Um camarada que achei na rua, que cuidei e que fui recompensado com uma grande amizade, com juros e correções, nesses últimos cinco anos.
Morreu ontem me deixando na saudade. Morreu como todos morremos, pois a maldita velhice o levou, como nos leva a todos.
Me conformar? Não sei. Mas vou sentir falta do latido poderoso e desafinado, do mau humor , dos uivos noturnos...enfim, saudades do Boris. O vira-latas sujo, doente e velho, que tirei da indigência das ruas, e que é hoje um nobre da mais alta estirpe, dentro de meu triste coração.

Nos veremos um dia, caro Boris. Tenha certeza. É isso aí.