O
Zé Maria
Márcio Barker
Outro dia, sei lá
porque, lembrei dele. E olhe que já faz trinta tantos anos que se
foi.
Pois é, aparentemente o
tempo vai esmaecendo as imagens. Mas acho que só aparentemente.
A história pode até
parecer meio piegas, não importa, todos temos o direito, até em ser
piegas.
Mas, lembrei dele, sim.
Puxa já faz tempo, mas tem coisas que ficam guardadas de modo
indelével ( “indelével”, “esmaecendo”, não gosto desses
termos pernósticos, mas não vieram outros no momento, me desculpem)
Mas, pois é, lembrei
dele, e de outras coisas.
Foi ele, por exemplo o
primeiro a me falar sobre Noel Rosa. Cantou até um trecho de
“Conversa de Botequim”. Aquela que diz assim - “Seu garçon
faça o favor de me trazer uma boa média / que não seja
requentada...”
E foi me explicando, como
o malandro aborrecia o garçon, com a sua malandragem.
Eu era bem pequeno, mas
achei engraçado.
Foi ele que, aos cinco,
ou sei anos, me contou sobre a batalha aérea, nos céus da
Inglaterra, no início da Segunda Guerra Mundial.
Ah, sim. Ele também foi
o primeiro a me contar como aquele incrível violinista tocava
composições inicreditáveis, apesar das cordas de seu violino irem
se arrebentando. Diziam que tinha parte como diabo. Depois, piscando
o olho, também me contou que era o próprio músico quem
arrebentava as cordas do seu violino. Era Nicolo Paganini.
Ainda ele, o primeiro a
me explicar, imaginem, como funcionava uma locomotiva a vapor e uma
locomotiva diesel – elétrica. E, boquiaberto, via com que maestria
fazia com a mão esquerda, o genial contracanto, nos foxes e ragtimes,
quando se sentava ao piano.
E, incrível, mesmo sem
entender muito, na minha cabecinha de criança, eu “via” o
malandro pedindo a média, também os aviões voando sobre a cidade
em chamas, o louco violinista no palco, e as locomotivas funcionando.
Anos mais
tarde,coincidentemente pesquisei e escrevi programas de rádio sobre
o tempo malandro de Noel, li muito sobre as Segunda Guerra Mundial,
escrevi sobre Nicolo Paganini, o impagável violinista. Até hoje o
contracanto me fascina. E, para completar, sei lá porque, adoro
trens. Bem, quanto a esse último item, sei que foi influência
direta de quem primeiro me falou sobre eles. Sim, foram muitos os
passeios de trem, na minha infância, assim como ela foi brindada com
o presente preferido, dos meninos de minha época – o trem.
E foi ele pródigo nesse
particular, pois foram muitos os trens a corda, de lata, de madeira, a fricção, elétricos!!! (não estávamos ainda no tempo do
plástico)
Lembro do seu sorriso de
felicidade, ao estender mais um trenzinho, para minhas pequenas e alegres mãos de garotinho.
Viajei muito com todos
eles. Viajo ainda, na minha lembrança.
Quem era ele?
O velho Zé
Maria, meu pai, o cara que me deu o fio da meada, para tantas coisas.
Gostaria de dar uma
abraço nele, mas...
imagem acima retirada de - manualdohomemmoderno.com.br
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