sexta-feira, 29 de junho de 2018

O P5


O P5
Márcio Barker




Puxa vida!!! Sim, ainda me recordo do velho P 5.

Como faz tempo!!! Éééééé...tô ficando velho...mas quem não fica? (não serve como consolo)
Meu pai chegava em casa, com o Guia Levi, aliás, lendário Guia Levi que nem existe mais. Nele, muitas páginas e letrinhas letrinhas pequenas, evitando que o guia fosse, ainda, mais grosso.
Nele, caprichosamente, literalmente, todos os horários dos trens que corriam por Sâo Paulo, ao menos é do que me lembro.
Era época de férias, e meu pai buscava um trem que fosse para São José do Rio Preto.
Foleava e, passando o dedo sobre os horários, meu pai dizia, que o melhor, seria viajarmos no P 5, da Estrada de Ferro Araraquara. Ele saia todos os dias rigorosamente às oito e trinta e seis, da estaçãoda Luz, na capital dos paulistas. Ah, sim. Tinha a classe Pullman, Primeira Classe e Segunda Classe.
Meu pai, que não era pobre, mas tampouco rico, comprava a Primeira Classe.
Na noite anterior a viagem,dispensável dizer que eu não conseguia fechar os olhos, pensando no P 5.
Na manhã seguinte, quando eu chegava na Estação da Luz, lá no centro da didade de São Paulo, não deixava de admirar a sua beleza e imponência, tão simples. Era incrível esse contraste. Aliás, a Estação da Luz era uma velha conhecida minha.
Construída pelos ingleses, toda de ferro, com tijolos vermelhos à mostra, feitos, assados e vindos da Inglaterra, em navios. A corbertura em curva era admirável. Felizmente, a Estação da Luz, ainda está lá, apesar dois dois terríveis incêndios que sofreu. Um deles, provavelmente criminoso, o outro, por descaso.
Naquela manhã, ainda garoto, eu corria na parte superior, buscando o P 5, na parte de baixo. E, lá estava ele, soberbo, lindo, imponente, simpático, sério, compenetrado, pacientemente aguardando os passageiros, e o horário de partir. Seus vagões eram de alumínio, num elegante metálico.
Desciamos para a plataforma. Éramos educadamente levados ao vagão que deveríamos embarcar.
Por dentro, o P 5 era lindo, amplo, confortável em sua simplicidade, e, imaginem, tinha até ar condicionado. Aliás, dizia-se que o ar condicionado do P 5 era feito à base de blocos de gelo, colocados em galerias dentro de cada vagão. E, depois, fazia-se passar uma corrente de ar sobre o gelo, e que penetrava em cada vagão.Entenderam? Simples, mas funcional.
As poltronas, reclináveis e confortáveis eram imbatíveis, acho que nem as dos aviões e ônibus de hoje, são melhores.
De repente, ouvia-se uma campanhia, lá fora: “Triiiiiiimmmmmmm”.
E, lá na frente a soberba locomotiva elétrica, English Eletric, inglesa, respondia com um severo Oooooooohhhhhhhhhhhhh”.
Nossa, o coração do menino disparava.
Pessoas ainda enbarcavam, malas, pessoal sentando, e eu aflito para ver o P 5 partir.
Daqui à pouco outro “Triiiiiiimmmmmmm”.
E, logo nova resposta Oooooooohhhhhhhhhhhhh”.
E, eu, garoto, ficava fascinado. Puxa, que coisa magnífica.
O chefe do trem passava, e perguntava se estava tudo bem.
Sim! Sim! Meu caro, tudo bem. E o Trem, já vai sair?”
Daqui à pouquinho, calma” Respondia o simpático chefe do trem.
A Agitação continuava, principalmente dentro de mim.
De repente, novo “Triiiiiiimmmmmmm”
Era o terceiro, será que a locomotiva vai responder?
E, para minha felicidade...
Oooooooohhhhhhhhhhhhh”.
O coração a mil. E sentia os primeiros passos do trem. Inicialmente devagar. Mas logo ganhava velocidade. Eu ficava facinado com que rapidez ele ganhava velocidade. Saia veloz e, eu, afundava na poltrona.
Que coisa incrível!!! Daí ficava vendo os trens de passageiros e de carga estacionados ao longo da linha. Via também os maravilhosos galpões, caprichosamente construídos pelos ingleses,há tantos anos passados. Todos de tijolos vermelhos, à mostra, com imensas janelas envidraçadas. Eram prédios imensos, sérios, sóbrios. O que haveria lá dentro? IE não faltavam várias fábricas, como a do Matarazzo, onde os trens entravam para pegar mercadoria, a ser transportada.
Mas o P 5 parecia ter pressa. Lá na frente, a Locomotiva English Eletric ia abrindo caminho com seu apito: OOOOOOOOOoooooooohhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!!!! Vermelha com faixas amarelas, ela ia lá na frente exibindo toda a sua imponência. Atrás vinhamos nós, nos elegantes vagões Budd Mafersa, de alumínio. E o P5 ia passando pelas porteiras, onde estavam carros, ônibus e caminhões aguardavam a sua imponente e importante passagem. Grande P5!!!
As estações se sucediam – Barra Funda, Lapa, Pirituba...
Detalhe: Ninguém jogava pedras no trem. Um São Paulo de outros tempos.
Logo, ele chegava em Jundiaí, porta para o interior paulista. Nossa!!!! Que estação linda, parece de brinquedo, cheia de detalhes artísticos, do final do século dezenove. Ainda está lá...incrível!
Em Jundiaí,havia uma troca de locomotivas, aliás, lendária, pois não eram poucos os que se davam ao trabalho de descerem do trem, para assistir essa troca.
A English Eletric se desligava, e se despedia, e logo vinha a fantástica locomotiva GE, apelidade de “V8”, branca, azul, com um faixa cromada no centro. E lá estava o imponente logotipo “CP”, da Companhia Paulista de Estradas de Ferro, a ferrovia dos cafeicutores paulista. Aliás, como quase todas...ou todas.
Novos “trimmmms”
Novos “Oooohhhhhs”
Nova taqucardia
E lá vamos nós.


A linha da Pauista era maravilhosa. Com poucas emendas, não havia muito barulho das rodas do trem. Chamava a atenção a velocidade que alcançava. E, para meu espanto de menino, o trem entrava nas curvas, do jeito que vinhas nas retas.
Maravilhado, eu colova o rosto na janela, que não abria por causa do ar condicionado, e ficava vendo a paisagem. Lá longe, bem longe, as montanhas imóveis. Mas pra cá, casas, árvores, edifícios que passavam devagar e, aqui bem perto da janela, tudo passava tão rápido, que mal dava para ver o que era.
Daí a pouco entrava no vagão um sujeito, com uma enorme cesta presa no peito. E anunciava jornais e revistas. Lembro da “O Cruzeiro”, “Manchete”, “Fatos & Fotos”. Revistas em quadrinhos, “O Pato Donald”, etc e tal, tudo muito comportado, nada de mulher pelada na capa, o que, diga-se de passagem, eu precocemente já sentia falta...
Era 1962, as notícias se referiam a próxima Copa de futebol no Chile. O Brasil seria bicampeão? A política estava agitada. João Goulart, presidente, era acusado de “comunista”, a tercerira guerra mundial, rondava o mundo, o twist era a nova coqueluche roqueira. E a miss Brasil daquele ano, foi uma baiana, aliás bonita. Me lembro do nome, Maria Cavalcanti. Não lembro se ganhou o título de Miss Universo. Eu gostava de ver notícias desses concursos, só pra ficar de olhos nas pernas...
Bem, depois do sujeito das revistas e jornais, vinha outro camarada, com outra cesta. Eram sanduiches variados. Queijo, presunto, queijo com presunto,salame (com ou sem queijo), no pão de forma, ou no francês. Eu pedia para minha mão, com um guaraná. E ela dizia, que se eu comesse, não iria almoçar. Que raiva!
Dalí à pouco, outro camarada, com outra cesta, dependurada no peito: Chocolates, variados, em tabletes, brancos ou marrons, bombons, pirulitos verdes, vermelhos, amarelos (não lembro se haviam azuis), balas paulistinhas (eu adorava), goiabada, pipoca doce, cocadas (tanto da branca, quando da marrom) doce de leite (com ou sem côco).
Claro, formiga,eu pedia um monte deles para minha mãe. Depois de muita negociação, conseguia sair ao menos com o chocolate e o doce de leite (sem côco). Mas já estava no lucro.
Quando o P5 se aproximava de Araraquara, anunciavam o almoço. Aliás,a fome já estava me rondando a algum tempo.
O vagão restaurante era um luxo, tinha até um vasinho com flores na mesa. Elegantes toalhas brancas, limpíssimas e passadas a ferro, como bonitos guarda napos de pano. Tudo muito caprichado.
Escolhíamos no menú, o que queríamos. Eu sempre pedia filé mignon refogado com batata, cenoura, azeitonas verdes, alcaparras, ervilhas, tudo no azeite de oliva. Para acompanhar, arroz branco, feijão (bem gordo), farofa mista, e dois ovos fritos (com gemas moles). Na época não se falava de semonela. Acompanhando, um belo guaraná. Sobremsa, figo, ou pêssego em calda, com chantilly. Bão, né?
De volta ao nosso vagão, claro que eu não dormia. O meu desejo era usufrir do P5, até o fim da viagem.
Na estação de Araraquara, a linda locomotiva elétrica, V8, da Companhia Paulista, dava lugar a respeitada locomotiva diesel-elétrica, GP 18, da Estrada de Ferro Araraquara. Toda vermelha, emdois tons, com detalhes amarelos, era, naminha opinião, linda.
Eu ficava sempre esperando o baque no trem, quando ela engatava no primeiro vagão.
Tudo de novo, em relação aos “Triiiimmmmmmmms” e aos “OOOOooohhhnsssss”
Mas um detalhe. A GP18, não era tão forte quanto as elétricas. O seu motor diesel elétrico, se esforçava para vencer a inércia. Ela saia bem mais devagar, e eu ouvia o lento sair, pelo ruído das rodas, nos trilhos “plac -plac.....plec – plec” tudo lento, sem muita pressa.
O P5 levava mais tempo para ganhar velocidade. Ia aos pouco. E, lá da frente vinha o ruído do motor diesel, em seu esfôrço para ir levando o trem. Era mais ou menos assim: “GrrrrrrrrrrrrrRRRRRRRRR”. E lá iamos nós.
De Araraquara pra frente, as retas eram imensas, o horizonte bem aberto, não haviam montanhas significativas, lá, bem longe, eu via o chão se juntar com o céu, como no mar.
A tarde já vinha chegando, o Sol, ora estava de um lado, ora de outro. Haviam pastos e plantações imensas. Ao longo da linha, nas estradinhas de terra, pessoas acenavam para o trem, e eu respondia. De repente, o P5 perdia velocidade, o ruído dos freios anunciavam uma nova estação. Ia olhar, não era nenhuma estaçãozona grande, mas uma estaçãozinha pequena, que sumia diante do tamanho do P5. Nela, duas pessoas subiam, e uma descia. O P5 apitava novamente, e arrancava vagarosamente. E, volta e meia ele parava nessas pequenas estações. Eram estaçõeszinhas dos primeiros tempos da ferrovia, e das marias-fumaças. O tempo passou, e elas permaneceram. E, o P5, em toda a sua imponência, não ignorava as pequenas estações. Eu não ligava, pois assim, a viagem iria demorar mais, e mais.
Mas chegava uma hora que a bunda começava a ficar quadrada e, sempre que o chefe do trem passava, eu perguntava quanto ainda faltava.
Pacientemente ele dizia: “Matão, Taquaritinga, Santa Sofia, Santa Adélia, Catanduva,Uchoa, Cetral, Engenheiro Schmit, Rio Preto.”
Nossa, tudo isso? E o P5 prosseguia
Se o chefe do trem passava novamente, novamente eu perguntava.
E ele, pacientemente - Santa Adélia, Catanduva,Uchoa, Cetral, Engenheiro Schmit, Rio Preto.”.
O Sol ia descendo, e o P5, impertubável continuava. Será que não se cansa? Não, claro que não. A paisagem continua a mesma, e a fome já volta a rondar. Já eram umas quatro da tarde, e, desta vez convencia minha mãe. Resultado, um belo misto frio, com um guaraná geladinho.
O chefe passa novamente.
Quanto falta, chefe?”
E ele, pacientemente.
Cetral, Engenheiro Schmit, Rio Preto.”
Hummmmm, já estava perto. Que bom. Mas ao mesmo tempo, que pena. Logo iria me separar do P5. Tratei de degustá-lo nos últimos minutos de viagem.
Logo chegamos na estação de São José do Rio Preto.
Descemos, abraços em quem nos aguardava, beijos, etc.
Enquanto os adultos papeavam, eu olhava o P5, com certa pena.
Logo o terceiro apito da locomotiva GP 18, avisava que iria embora.
Fiquei olhando pra ele.
Ouço: Márcio, vamos indo...”
Faço um gesto com as mãos para que me esperem um pouco. Estava muito ocupado me despedindo do P5. Lá foi ele, se perdendo na distancia, da incrível reta, até que uma distante curva, roubou ele de mim.
Olho no calendário, e vejo que isso foi a quase sessenta anos. Não! Que mentira! Foi ainda ontem. As cores, os apitos, a campanhia, o sabor do filé, do sanduíche, o cheiro do diesel, o ruídos das rodas nos trilhos, as paisagens, a V8, o simpático chefe do trem, estão tudo aqui, vivos, presentes, em sons e imagens claras. Se fosse a sessenta anos, já estaria tudo desbotado, apagado, perdido. Não! Não foi há sessenta anos, foi ontem, no máximo na semana passada.
E o P5, onde andará? Nunca mais o vi, mas certamente continua cruzando aquele interiozão, se anunciando com seu apito forte, que jamais será esquecido.
Pois é...bons tempos não morrem nunca!!!!
Eu decreto isso!

Imagem - folhanovoeste






quinta-feira, 14 de junho de 2018

É sempre muito pouco...


      É sempre muito pouco...
Márcio Barker 

Tempo · amor · ampulheta · vermelho · corações - foto stock © Zoya Fedorova  (zven0) (#6931657) | Stockfresh
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Mesmo conversando todos  os dias com você,
é sempre muito pouco!!!
Mesmo que eu vá, e veja você todo santo dia,
quando me vou, sinto que foi tão pouco.
Quando estou por perto de você...
bem juntos...
...puxa vida, como é bom!!!
Mas quem sabe por isso mesmo, é muito pouco!
Quando vou ver você,
estou feliz!
Mas sei que será muito pouco!
Sabe, gosto de escutar você,
ver seus olhos irrequietos...entusiasmados com a vida.
Gosto quando segura meu braço, e me puxa para perto de você.
Mas, por que será que acho muito pouco?
Por que tudo que se refere a você,
me parece tão pouco?
Mesmo que eu me afogue em você...
por mais que sejam os abraços...
por mais  beijos tão apaixonados,
quando me vou, acho que foi tão pouco...
Vou feliz ver você!!!
Nossa! Como é bom saber disso!!!
Mas, já sei, será tão pouco para mim...
Na volta, mesmo que feliz por ter estado com você,
me sinto triste...pois foi muito pouco...tão pouco...
Mas resta algo de bom.
Guardando cada pouquinho,
sei que de pouco em pouco,
você irá me pertencer por inteira...
Sou paciente...

Imagem  Pinqtree