sábado, 2 de março de 2024

 

Pelo amor de...

Márcio Barker

                                                                                                            internet

Minha vida nunca foi de grandes novidades.

Por exemplo, oriundo de uma família católica, me fizeram cumprir o script:

Fui batizado, crismado, fiz catecismo para a primeira comunhão e, volta e meia, era obrigado a comungar.

Eu tinha uma tia, (tadinha sei que era com boa intenção, se bem que o inferno está cheio delas.) que volta e meia vinha toda sorridente, com um ar maternal e ia dizendo pra mim:

Marcinho, a tia fez uma promessa para você.”

Eu gelava, num misto de raiva com arrependimento, pois era “pecado” sentir raiva daqulo.

E, nem me lembrava de saber com que intenção ela tinha feito a tal promessa.

E depois ela complementava:

Olha, todo domingo, por três meses, nós dois vamos comungar juntos, tá bom?”

Tá bom”, nada!!! E eu me perguntava porque ela sempre tinha que me colocar no meio das promessas que fazia.

Pequeno, não tinha direito algum, senão resignar-me, e nos próximos três meses, ter que confessar, e comungar.

Confessava no sábado, e comungava, no domingo. O problema era que, do sábado, ao domingo, eu não poderia “pecar”, caso contrário acho, que prejudicaria a comunhão, no domingo.

O duro era confessar. Mas confessar o quê??? Ainda menino, era um inocente, ainda longe dos pensamentos inconfessáveis que viria a ter, alguns anos depois (Aliás, e principalmente quando comecei a namorar...)

Daí entrava no tal do confessionário e, diante de um cara que nunca vi, tinha que ficar falando mal de mim mesmo. Não tinha o que dizer. Inventava “pecados”. Lembro que em casa haviam galinhas. E, uma vez, eu disse que não era muito legal com elas. Que as aborrecia. Sim, às vezes gostava de correr no meio delas. Seria pecado? Bem, o padre mandava rezar algumas orações. Hoje, fico pensando se ele não julgava que eu costumava "enrrabar" as galinhas!!! Bem, nunca fiz isso, pois no tocante a essa atividade, eu preferia (como continuo preferindo) a minha própria espécie, mas do sexo oposto, bem entendido.

Bem, mas a coisa não parava por aí. Segundo a promessa de minha tia, depois dos três meses, a última comunhão deveria ser feita numa cidade, famosa pela religiosidade, e pelo comércio da fé, cidade que nunca gostei mesmo!!! Detestava ir até lá.

Tudo aquilo que eu via por lá, era mórbido demais. Mas, eu era pequeno, heróicamente tinha pouco a fazer, mas, ao menos, sabia que era a última vez que teria de passar por tudo aquilo.

Lembro de um tal “salão dos milagres”, que era onde os fiéis, que se sentiam atendidos, agradeciam neste salão. Se o cara sarou de uma doença na mão, ele em agradecimento depositava uma mão, de cera. Se ele teve um problema no pé, depositava um pé de cera. Hoje lembrando, vejo que os tempos eram bem outros, pois numa época, em que não havia o Viagra, não lembro de ter visto nenhum “membro” masculino, de cera. Digno de nota.

Me recordo, que fiquei particularmente curioso, quando vi depositarem no tal salão, um agradecimento em meu nome: uma cabeça de cera!

Engraçado que tudo aquilo para meus olhos de garoto, era algo além de minha compreensão.

Uma vez compraram um quadro de Cristo, aquele célebre, com o coração sangrando nas mãos. Aquela figura me impressionava mal.

Colocaram o quadro na parede, chamaram um padre. Disseram que era para “entronizar” o quadro. Hoje nem faço ideia do quadro, nem do que é “entronizar”.

Acho que sou meio iconoclasta e, um reles pecador. Se bem que, a palavra “pecar” tem muitas interpretações.

Não sou religioso, apesar de todo esfôrço de meus país, e de minha tia. Não sou daqueles que “Deus isso”, Deus aquilo, e aquilo outro. Não gosto de incomodar, me viro com as ferramentas, que me disseram que ele nos dá.

Me contaram que Deus nos teria feito a sua imagem e semelhança. Sempre tive grandes dúvidas sobre isso. Penso que é o contrário. Nós julgamos Deus, como a nossa própria imagem de humanos. Daí, ouvir falar de um Deus, violento, vingativo, carrasco, pronto a nos enquadrar como pecadores e, e pródigo em castigos.

Mas quem sou eu para ficar aqui filosofando. Em todo caso, mesmo não sendo religioso, o meu Deus, é o de Spinoza. O Deus que não vive, com se julga, em templos escuros e lúgubres, mas na natureza. Um Deus que não critica, não julga, nem castiga. Pois é puro amor. Um Deus que se pergunta, como poderia nos castigar, se foi justamente ele quem nos criou?

Imaginar um Deus que nos coloca medo, acho eu, que não faz sentido.

E, contrariando tudo o que me ensinaram na infância, e que fiz questão de não aprender, e esquecer, na minha imaginação, quando penso em Deus, acho que ele é um cara legal e  inspirador.

Será que tô certo?

Falando nisso, será que vou para o céu, quando eu esticar as canelas?



Nenhum comentário: