O
Último Romântico
Márcio
Barker
Quando
pequeno:
Eu
gostava de ficar na janela da casa de minha avó, vendo o sol ir
embora.
Gostava
daquele céu meio azul, meio vermelho.
E
do ar do entardecer.
Gostava
de ver o homem do carrinho de doces passar em frente.
Gostava
de ver mina avó na cadeira de balanço, fazendo crochê.
“Vó,
me conta uma história de fantasma”.
Ah,
como eu gostava das histórias de minha avó.
“Vó,
me faz cafuné”.
E
como gostava dos cafunés de minha avó.
Gostava
de escutar o relógio da parede bater seis horas.
Do
papagaio chamado: “Donana,
Donana”
E
escutava de longe, a algazarra dos pássaros se recolhendo para mais
uma noite.
Como
seria a noite dos passarinhos?
E,
lá de longe, eu escutava o apito da velha locomotiva a vapor, que
passava pela Lapa.
Nossa,
que música!
Quando
garoto:
Ficava
ouvindo as histórias de meus pais, tios, tias.
Quase
não dizia nada, mas ouvia tudo.
Eram
engraçados, brincalhões, piadistas, tranquilos.
Às
vezes pegava um 78 RPM, subia numa cadeira, e colocava ele no
vitrolão.
Ouvia,
ragtimes, fox trots, Noel Rosa, Carmem Miranda.
Ah,
sim, ouvia Chico Alves também. Uma composição me chamou a
atenção, e dizia mais ou menos assim:
“Violão,
companheiro/ de tanto roçar no meu peito/ tens o timbre perfeito/ da
voz do meu coração”.
Bonito, não? Bem, eu
gostava.
Já entendia, pois sempre
lembrava da menina bonitinha, que sorria pra mim, quando passava em
frente de casa.
Já crescido
Lembro da mesa de pokker
da velha turma do bairro (eu sempre roubando).
Lembro das farras, da
irrevedrência.
A! Bom eram os namoros,
os olhares apaixonados, as carícias.
Amava chegar da
faculdade, ou do trabalho. Jantar. Ir para o quarto, acender um belo
cigarro (na época eu fumava), e escutar jazz, blues, mas também
aquelas coisas do Nelson Gonçalves:
“Boemia/aqui
me tens de regresso/e suplicante te peço/a minha nova inscrição.../
É..ééééé...e no
acompanhamento, bandolim (do Jacob), cavaquinho, flauta, violão de
sete cordas, pandeiro.
E lá ficava eu sonhando
com um vulto de mulher, que ia se desenhando aos poucos, na minha
imaginação...
Mesmo roqueiro
bagunceiro, lá no fundo era também, um romântico.
Puxa vida! E quem será
essa mulher?
Ela existe?
E se existe onde estará?
Será que irei
encontrá-la?
Será que gostará de
mim?
Mas cadê ela?
E já bem maduro:
Lembro da janela de minha
avó, de suas histórias e do cafuné.
Lembro ainda, muito bem,
daquele velho trem.
De meus pais,tios, tias e
de seu bom humor.
Da garota que sorria pra
mim, lá da rua.
Da velha turma
Das canções do Nelson
Gonçalves
E do vulto de mulher, que
sempre quis saber quem é.
Acho que estou me
descobrindo um romântico...quem sabe o último.
Será?
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