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Uma Sabiá - Márcio Barker
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Gente como os compositores Adelino Moreira e Lupicínio Rodrigues, foram os campeões das tragédias amorosas, em forma de samba-canção.
Mas por que toda essa história? Bem, ela me lembra mais uma, das muitas histórias dos doces tempos juvenis.
Inicio dos anos sessenta. Lá ia o Alceu (naquele tempo “Alceuzinho”). Naquele tempo ele caminhava mais “de largo” do que “de alto”. Gordíssimo, suas calças “Lee” desgastavam no entre – coxas.
Mas logo veio a puberdade e com ela, pouco de maturidade além, é claro, do interesse pelas mulheres. Daí resolveu “fechar a boca”, tomar uns banhos turcos, e emagreceu. Até que ficou bem, dentro do possível.
Nos últimos anos daquela década, via-se um Alceu com uma silueta bem diferente.
Rico, não demorou a ganhar um fusca novo em folha, do velho e bom pai que o paparicava. Mas logo, logo viria o principal: ele foi presenteado com um luxuoso “Galaxie” dourado.
Daí caiu na vida. Paquera na “Augusta”, noitadas no “Ton-ton”, sempre regadas a cokteils de frutas, mulherada, enfim, um playboy. Suas roupas lembravam a de um toureiro. Sempre justas e coloridas. O vinco da calça, perfeito de chamar a tenção. Para completar, cinturão, cabeleira impecável etc e tal.
Numa dessas saídas, Alceu encontra a sereia. Sim, daquelas que hipnotizam, dominam, e que fazem um homem ficar abobado. Daquelas mulheres que fazem valer o célebre ditado: “Um pêlo pubiano feminino move navios”.
Alceu foi envolvido e dominado qual vítima de serpente peçonhenta. Uma serpente que domina sua vítima com os olhos.
Sei lá porque, ele apelidou a garota de “Sabiá”. Daí por diante tudo era a “Sabiá”.
Um dia o encontrei. Tinha um olhar severo, e falava na tal “Sabiá” com tanta seriedade, que brincando perguntei se iriam comprar alianças. Seriíssimo, respondeu:
“Estamos pensando nisso”.
Fiquei abalado. Vi que a coisa estava feia. Pobre rapaz.
O cara sumiu. Eram olhos só para a “Sabiá”. “Sabiá” prá cá, “Sabiá prá lá”, noitadas no “Tonton”, cokteis de frutas, dá-lhe Galaxie, noites a fio de sexo incrível e inédito, etc e tal.
Nunca me esqueço de quando ele apareceu dizendo que “tinha dado onze” com a “Sabiá”. Com um detalhe: numa única noite! Fiquei pensando no panteão dos heróis, deuses e semi-deuses da Grécia e Roma antigas. Ali estava Zeus segurando raios com a mão direita. Também Baco, com cachos de uva na cabeça e, na mão direita, uma taça de vinho. Ao lado, Netuno empunha o seu tridente. E, logo depois, lá está o Alceu em sua formosura, tendo na mão direita o seu vigoroso e ímpar penis.
As semanas se passaram, e o grande amigo Alceu, envolvido em seu romance sem precedentes…deixou de lado até as amizades mais fiéis.
Não demoraria o desfecho do romance, aliás previsível, menos para o desatento Alceuzinho.
Foi quem sabe um domingo, não me lembro bem. A “Sabiá” disse que “teria” um compromisso. Não poderia sair. Naquela noite, Alceu sai em seu Galaxie dourado, acompanhado de um amigo, o Eduardo.
Não sei bem se foi na “Augusta”, ou nas proximidades. Leve, Alceu aprecia o ambiente festivo e colorido, com o espírito “lavado” por mais um sexo homérico, no dia anterior.
O tráfego para. É nesse momento que a tragédia se desenha em rápidos e tenebrosos traços. Ali, bem ao alcance de seus olhos, no meio-fio, um carro, aliás importado, não sei se BMW ou Mercedes, quem sabe um Porche. Dentro dele, a silueta da “Sabiá” completamente envolta nos braços de um musculoso “Romeu”. Dava para ver a saliva escorrendo. Sem dúvida, o beijo devia ser de língua. O pobre Alceu petrificou… nenhum movimento, olhos estalados. Ao lado o Eduardo arrisca:
“Quem sabe um primo. Um conhecido…” Mas nem ele mesmo acreditou no que disse.
Hecatombe!!! Ferido de morte, Alceu entrega o volante ao amigo.
Dias depois encontro a turma. Ali, meio de lado, estava o Alceu.
Olhar abobado, perdido, rosto chupado, cinza, despenteado, barba por fazer e aparvalhado. Boca entreaberta. Fiquei preocupado. Seriam vermes?
Chamaram-me de lado, e contaram a meia boca o sucedido. Sabendo como eu sou logo fizeram uma recomendação:
“Não tira sarro porque o cara ta mal! Mas mal mesmo!!!”
Mais uma vez se confirmava o velho e antigo ditado que diz assim:
“Meu amigo, você que é metido a comedor e ingênuo, cuidado, pois um dia poderás levar sabe onde?”
Melhor não dizer.
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